A pergunta que sempre
Esteve
Ardendo por mim toda é a
Mesma
Que insiste em ser resposta
E quanto mais alto eu vôo mais ou
Menos enxergo o sentido da vida
Nem mesmo sei aonde ir
À quem buscar o que falar
Sou e sempre soube em desalento
Ser eu mesma a guardiã do meu destino
No entanto, em nenhum momento
Fui de fato feliz ou sorri como os outros:
De verdade de alegria ou de escárnio
Ser solitário escolhido por Deus
A ser infiel em minha fé.
Lembro do homem que bebeu até cair
Do cachorro que latiu até partir
Do meu quintal cheio de frutas
E de roupas no varal
Que hoje ninguém mais as recolhe
Estão sujas na memória da criança
Ficaram amarrotadas sob o corpo
Daquele homem que dormiu de vez
Numa tarde de outono, numa cama de solteiro…
Mesmo assim, a vida me arrasta
E preciso fingir aos outros
Que há vida no meu corpo
Que acredito em futuro, em bruxas
Em duendes, sorte e felicidade.
Mas a mesma fina e cortante dor
Que senti quando rasguei o pé e caí da árvore
Acompanha-me por todo o sempre
E naquele quintal de abacates e romãs
Ainda avisto ao longe um vestido azul
Agarrado nos galhos da árvore
Que hoje é apenas um tronco ancião
De uma goiabeira cansada de brincar…
Mas o quintal ainda existe e me olha
Quando passo e lembro quando antes
Eu brincava alí, uma menina só
Que enterrou as roupas
Em alguma parte daquele chão
Que hoje é garagem de carros.