Há coisas tão eternas, há coisas realmente impressionantes


Childe Hassam

Canteiros (Cecília Meireles)

Quando penso em você fecho os olhos de saudade
Tenho tido muita coisa, menos a felicidade
Correm os meus dedos longos em versos tristes que invento
Nem aquilo a que me entrego já me traz contentamento
Pode ser até manhã, cedo claro feito dia
mas nada do que me dizem me faz sentir alegria
Eu só queria ter no mato um gosto de framboesa
Para correr entre os canteiros e esconder minha tristeza
Que eu ainda sou bem moço para tanta tristeza
E deixemos de coisa, cuidemos da vida,
Pois se não chega a morte ou coisa parecida
E nos arrasta moço, sem ter visto a vida.

Boazuda e malzuda

Ser bom ou ser mal. Talvez ser idiota seja mais fácil. Porque não há como opinar. Nem bem nem mal. Ambos coexistem em teu interior, e no meu também. O que pode fazer a diferença é a educação ministrada em cada ser, de preferência na infância. Besteira e baboseiras. Maniqueísmo é papo de botequim, como futebol e mulher pelada. Tudo é bom e tudo é mal. Depende do teu pai e da tua mãe. Um menino aqui quebrou a perna de um gato de rua. Outro chegou, ficou com pena mas nada fez, nem comida deu, sendo sua mãe dona de retaurante. Hpocrisia incutida na raça humana.
Só pode ser o capeta mesmo, porque é inegável que somos feitos de amor. Questão de educação. Minha filha não tem. Eu dei, eu dei, entretanto não entrou, não pegou. Seria então questão individual? cada ser é mesmo um idiota individual?
Irônico notar que o gatinho continua meigo e amigo dos que o maltratam. Eu o maltrato, pois não o retiro da rua.
Já tenho vários bichos.
Eu sou bicho. Hipócrita, reconheço, miauu, pobre gato.
Nada de sete vidas. Bem e o Mal. Gato do diabo. Pro inferno o homem crente de idiotices. Vou passar por debaixo da escada e rir do vampiro. Meu vizinho é vampiro, cresci com essa lenda aqui no condomínio. Quem é bom e quem é mal? Vou morrer pensando. Ou não. Posso ficar boa antes.

Violência e Carnaval

Tirar das mãos de uma criança o que ela tem de mais valioso: sua infância.
A inocência foi levada embora por um ódio que saiu não se sabe de onde.
E entrou na tv. Mídia imediata, pow! Lá se vão hímem, bonecas e carrinhos.
Culpe-se a quem?
Os governantes. Talvez não.
Fala-se tanto neles e nada acontece.
Temo ser algo mais profundo, subterrâneo.
E por que não diabólico?
Disseram-nos que há muito mais coisas entre o céu e a terra.
Terra nostra, terra de ninguém, Haiti e Rio de Janeiro. Sudão sem ongs, mundão sem Governante.
Inocência se foi, e a criança chora quando acaba o crack.
Mamãe tem aids e papai foi trabalhar com balas perdidas.
Papai é a bala. Papai é o gerente.
Ainda ouço o choro do menino apanhando.
Dois policiais, ele chorava criancinha.
Não há um justo sequer.
E o calor continua
No país do carnaval.
Já comprou sua fantasia? Isso é bom.
Esconda-se.

Cena 25


(Divulgação)

Eu, pirada!
Estou escrevendo um roteiro. Eu o tomo em minhas mãos. Ou ele me consome como fogo infernal.
Amanheço abraçada a ele. Fizemos amor, ele fez maldade comigo. Roteiro meu, meu roteiro diabólico, porque me tira o sono. Por quê?
Meu roteiro… nenhuma cena. Vinte e quatro cenas e fim. Fade out. Tvplay. Mas se é o começo, onde termina em mim o meu roteiro?
Eia, Google, até você com essa cara de bonzinho a me ajudar. Meu roteiro dá voltas e desmaia na vida da mocinha. Acordo com ele, nos beijamos. Bom dia, boa noite, boa tarde, bom roteiro. Ufa, meu roteiro, estou aqui de novo, mas antes passei em meu blog, seu ciumento. Ele me puxa pelo braço, vamos lá! Escreva-me! Ordinária, olha as cenas, revise todas. Sem mim você nada é. Ok, roteiro, você é diabólico, mas eu vou terminar. Antes que você me consuma como fogo vermelho, eu vou fazer a próxima cena. Cena vinte e cinco. Custe o que custar, custe caro, eu sou tua e tu és meu. Próxima cena. Fora do blog. Tá.

Rio quarenta e quatro graus vou pro sertão!

SOBRADINHO
Biquini Cavadão
Composição: Sá / Guarabyra

O homem chega e já desfaz a natureza
Tira a gente põe represa, diz que tudo vai mudar
O são francisco lá prá cima da bahia
Diz que dia menos dia vai subir bem devagar
E passo a passo vai cumprindo a profecia
Do beato que dizia que o sertão ia alagar
O sertão vai virar mar
Dá no coração
O medo que algum dia
O mar também vire sertão
Vai virar mar
Dá no coração
O medo que algum dia
O mar também vire sertão
Na na na na na
Na na na na na
Adeus remanso, casa nova, sento-sé
Adeus pilão arcado vem o rio te engolir
Debaixo d’água lá se vai a vida inteira
Por cima da cachoeira o gaiola vai subir
Vai ter barragem no salto do sobradinho
E o povo vai se embora com medo de se afogar
O sertão vai virar mar
Dá no coração
O medo que algum dia
O mar também vire sertão
Vai virar mar
Dá no coração
O medo que algum dia
O mar também vire sertão
O sertão vai virar mar
Dá no coração
O medo que algum dia
O mar também vire sertão
Vai virar mar
Dá no coração
O medo que algum dia
O mar também vire sertão
Virou
Na na na na na
Na na na na na
Na na na na na
Adeus remanso, casa nova, sento-sé
Adeus pilão arcado vem o rio te engolir
Debaixo d’água lá se vai a vida inteira
Por cima da cachoeira o gaiola vai subir
Vai ter barragem no salto do sobradinho
E o povo vai se embora com medo de se afogar
O sertão vai virar mar
Dá no coração
O medo que algum dia
O mar também vire sertão
Vai virar mar
Dá no coração
O medo que algum dia
O mar também vire sertão
O sertão vai virar mar
Dá no coração
O medo que algum dia
O mar também vire sertão
O sertão vai virar mar
Dá no coração
O medo que algum dia
O mar também vire sertão
Na na na na na
Na na na na na
Remanso, casa nova, sento sé, pilão arcado, sobradinho
Adeu, adeus
Remanso, casa nova, sento sé, pilão arcado, sobradinho
Adeu, adeus
Remanso, casa nova, sento sé, pilão arcado, sobradinho
Adeu, adeus
Remanso, casa nova, sento sé, pilão arcado, sobradinho
Adeu, adeus

Já fui

Eu disse a ela: Já fui triste, impávido, louco, músico e médico.
Na verdade, falar este tipo de coisa para uma garota denota ainda uma certa loucura. Neste caso eu retiro louco porque ainda sou.
Tirei a rosa mais bonita do jardim da frente. Uma que ainda não desabrochara totalmente. Nova e jovem. Fresca como a minha menina.
Em tempo: eu também já fui jovem. Bonito e arrogante. Fiz fortuna e alguns filhos mimados. Quantos anos? Cinquentinha. Ainda bonito. Viril o suficiente. Rico, esnobe, mas ao mesmo tempo desapegado do dinheiro. Estranho e verossímel. Eu sei.
Queria dar tudo para ela. Meu dinheiro, meu conhecimento, e principalmente meu corpo.
Não tinha vinte ainda. Loucura. Eu estava apaixonado. Morreria por ela.
Depois que fiquei cego, muita coisa mudou. Passei a aceitar a mentira. Não via nada. Se me dissessem: o céu está lindo, eu cria, sem questionar o vento frio.
Ela dissera-me que era linda. Nunca a viram, os amigos, ou meus filhos. Os empregados não se atreveriam.
Dormi com ela. Uma vez só. Foi bom. Foi realmente bom. Mas depois…
Eu sabia, um médico que fica cego, é algo mais profundo do que parece. Dramático. Engraçado.
Era tudo mentira. Ela era uma mentira. Eu já não me importava com as mentiras.
Ela poderia ser menor de idade. Ela poderia ser mais velha. Ela poderia enganar-me por algum tempo. Para sempre.
A única coisa que eu não suportava, era sua ausência. Não exatamente sua ausência. Mas o fato de eu não enxergar o motivo de seu sumiço. Como eu não lia jornais, foi por pura sorte que a empregada, admirada diante da televisão, gritara em meus ouvidos: Patrão! Aquela moça que vinha aqui!… Ela… morreu!
Ela era bonita?! – foi tudo o que eu consegui dizer.

De volta ao futuro porque ninguém é como Kafka

Direi de nós, todos nós, animais que nada.
Somos a perfeição imperfeita.
E depois de Kafka, a humanidade ficou diferente,
o século vinte amanheceu em nós de forma perfeita e romântica.
Direi de nós e não de mim, que flutuamos numa atmosfera
chamada arte e que depois de Kafka, esqueci meu pai. E você?
Direi das estrelas que vagam, cada qual tem seu nome,
mas eu sei o meu e o teu. Estou falando de nós.
Da árvore que não cansa de dar frutos em nós,
nós somos assim, seres extraordinários. E fazemos arte.
Uns de nós escrevemos. E como é bom escrever. Melhor ainda depois de ser Kafka.
Eu não falo de mim, mas de nós todos, poetas,
dramascarados, escravos da poesia, romancistas… e contos!
Muitos contos. O Processo começou a ensinar,
vamos aprender mais, seguir os bons. Deitar a cabeça em travesseiro de madeira, morrer e viver de novo, escrevendo com o corpo e a alma.
Não falo de mim, falo de nós, escritores mortais de internet, o que faremos com Kafka? Abrimos um blog para ele? Gregor Samsa é editor, inventor de almas.
Precisa-se de Kafka. Correm os Processos.
Estamos condenados. Não sei escrever como Kafka. Falo por mim.

Se estou condenado, não estou somente condenado à morte, mas também a defender-me até a morte. (Franz Kafka)