Livros, amados livros

Se antes eu era cega é porque não os lia com a alma, talvez folheasse-os em costume e ironias escolares. Mas de qualquer forma fizeram sempre parte de minha vida em tempo integral.

Passei e hei de passar por maravilhosos momentos. Da ficção ao técnico, ainda romanceando os bestsellers, eu me recrio ávida por reativar conceitos e sei que tudo de que preciso é abrí-los com amor. Ouvir o que eles têm a me dizer.

Já fui fanática por eles e penso mesmo que adoeci muitas vezes entre tantas teorias e aforismos. Filósofos de vários séculos me acompanham e os deuses da poesia, seja ela concreta, a parnasiana,  moderninha, tanto faz. Eu sou ainda aquela que aprende a ler.

Com todo o respeito à internet, mas os antigos e mal conservados me atraem, levam-me a viajar no tempo.

Sei que são eternos. Eu vou passar, você também.

Porém eles são o poder da memória maior que todos nós.

Sim, meu querido… O céu deveria ser mesmo uma grande biblioteca.

Note e noites…

Você era o meu doce

Delicado como bala de côco antiga

A derreter na boca triste

Toda traição

Que coubesse em uma vida.

Meu céu de armagedon

Fogo a arder em beijos nucleares

Em subidas e fogosas noitadas.

E ainda teve a coragem de

Como um lorde camponês

Ir embora sem riso nem adeus.

Mas a vida é comédia de enganos

Não eras quem imaginei

E olha que ironia

Eu também mentia o tempo todo…

Estória de amor fadado

Que escritor não escreveria

Nem poeta a cantaria…

Por ser medíocre e ordinária

Ou de tão doída

Ninguém quisesse ouvir…

Cai assim em mal escrita página

No blog a rascunhar

Furtivas letras em desengonço

A provar a técnica errada

De um mal sentido amor.

Espíritos

Imagina tua alma transcendente

 A voar pelas estradas…

Ok, pense então que teus sentimentos

 São como a velocidade e

Que as estradas o fazem derrapar;

As estradas são as vezes

Que alguém te esmurrou

Mas desviando percebes que o tempo passa

Os carros mudam de aerodinâmica e cor,

Porém teu espírito, este é uma criança

Querendo colorir a vida, pois

Entre uma derrapada e outra

O abismo é apenas uma gangorra

No playground da eterna infância.

Decepção

Cora era envergonhada. Criança estúpida, não falava com ninguém. Anti-social, o fiasco de filha única.

Menina estranha, óculos grossos, pernas finas.

Cora cresceu, foi à faculdade e ainda balbuciando casou-se com Pícaro.

Mas o circo pegou fogo e Cora virou Mulher Barbada.

Fim de festa no tapete persa que o grego não pisou

Não havia sido convidada. Também não importava, só era preciso uma festa, conhecer alguém para esquecer seu divino, um meio homem, meio deus. Talvez um semideus letrado na filosofia antiga da Grécia. Educado e firme na performance da sedução. Eternamente jovem e alegre.

Um absurdo alienante o namoro equivocado de intelectuais sumidas no tempo. Semideuses podiam trair e colecionar estórias e cantadas, afinal.

O álcool descia bem, era bebida própria aos mortais, principalmente a uma mortal frustrada com homem tão misterioso e repleto de evasivas.

Quanto tempo fazia? Dias longos e intermináveis tentativas de contato. Por onde andaria tanta beleza grega, envenenada…

Cambaleou pela festa com seus trinta anos a levando para o abismo, imagens retorcidas pela paixão e pelo ódio mortal àquele homem raro. Patifaria dos deuses, encantador de serpentes. Chauvinista do Olimpo.

Já passava das quatro da manhã. O seu perfume ainda inebriava o ambiente, misturando-se aos hálitos de cigarro e vinho…

Rendeu-se à miserável condição humana, abriu os botões da jaqueta fake e ficou com o garçom.

 

C.R.A.Z.Y. – Loucos de amor

Na minha opinião o filme é cult pela direção, com cenário e trilha sonora apropriados aos questionamentos das décadas de 60 e 70. Pink Floyd é o carro chefe na trilha sonora que levou pelo menos a metade do orçamento.
Eu gosto de cinema canadense, principalmente falado em francês, como C.R.A.Z.Y.

Sinopse

Zac (interpretado por Émile Vallée até os oito anos e por Marc-André Grondin na idade madura) é filho do rigoroso Gervais (Michel Côté) e Laurianne (Danielle Proulx). Com a mãe, ele tem uma relação estreita; com o pai, incompreendida por ambos. Ao lado de quatro irmãos, Zac cresce sentindo desejos homossexuais, enquanto tenta lidar com a religiosidade da mãe e a intolerância do pai, entre os anos 60 a 80.
Argumentos para bons roteiros não são muitos, por isso o roteirista precisa buscar pérolas, sejam nos diálogos, na composição dos personagens.
Neste filme Jean-Marc Vallée desempenha uma direção contundente no sentido de captar a tensão dos personagens quase que esteorotipados, ou melhor, são mesmo estereótipos: dos quatro irmãos Zachary, o protagonista, tem tendências ao homossexualismo, enquanto o irmão mais velho torna-se drogado, outro é intelectual e outro desportista. O desafio é saber trabalhar os tipos comuns. Arquétipos fundamentais para resolver um drama/comédia como C.R.A.Z.Y.
Por aqui o filme estreou em 2005, um ano após seu lançamento no Canadá.
O que vale o título de cult e mais prêmios é, sem dúvidas o trabalho de roteiro. Acho perfeito.
Não por acaso o filme levou 11 prêmios Genie (o “Oscar” canadense) e mais 19 prêmios em outros festivais.

E por falar em saudade…

Onde ando eu com a cabeça, que não vejo mais o meu amor, meu mar, a minha praia do Recreio, onde desde  criança me acolheu como nenhuma outra; a praia que, democrática se divide em territórios.

Uns vão surfar, outros fazer um pic-nic em família;  e que saudade da minha turma, do meu bar Cultura e Chopp onde tocávamos blues a noite inteira. Lançando moda e movimentos. Depois o Carvatella, massa, vinho e alegria nas violas.

 Em outras cidades eu já morei, de frente pro mar, nas montanhas de Friburgo…

Mas nada se compara à Praia do Recrteio. A minha praia querida.

Quase um mês trancada em casa, lendo e escrevendo. Dormindo em frente à TV, ah! essa mão que rompe o tendão e me engessa em solidão. Rima involuntária, claro.

Acho que a felicidade está nessas pequenas coisas, nas lembranças boas. Principalmente quando a Natureza está envolvida. E só damos valor quando a sensação é de perda ou de saudade.

Sem mais choro nem vela, melhor apanhar um livro na estante.

Poesias de Augusto dos Anjos acho que cai bem.

 

 

To no Vácuo

 Jhon Wayne demorou nove anos e mais de cinqüenta filmes B para ser descoberto. 

 

Ando meio desanimada de escrever sobre roteiros com essa mão esquerda. Lá no meu blog  Escombros do Vácuo onde trato disso, estou voltando aos poucos. Tenho assistido a muitos filmes em casa, em especial os da década de 50, 60 e 70. E contemporâneos também, principalmente os franceses.

Se quiserem ir lá, de quebra podem conhecer minha cara.

Mas não desistam de navegar no blog por isso.

Robert Frost

Acabei de ler umas poesias de Robert Frost, esse que é talvez o maior poeta norte americano do séc. XX, ganhador de quatro Pulitzer.

A poesia chama-se Mending Wall, ou Muro Remendado.

Vou ao médico amanhã ver minha mão (ainda engessada) e fiquei pensando se não tivesse companhia, que vizinho chamaria para ir comigo. Leia esta maravilha e pense se você tem um bom vizinho…

 

Muro Remendado (Mending Wall)

Alguma coisa existe que não aprecia o muro,
Que enfia bojos de terra gelada por baixo,
E derrama as pedras superiores ao sol,
E faz buracos onde até dois podem passar abraçados.
O trabalho dos caçadores é outra coisa:
Eu cheguei depois deles e fiz a reparação
Onde não deixaram pedra sobre pedra,
Mas conseguiram pôr a lebre fora do esconderijo,
Para deleitar cães latidores. As brechas, quero dizer,
Ninguém as viu fazer ou as ouviu fazer,
Mas na época primaveril dos arranjos encontramo-as lá,
faço o meu vizinho saber para lá da colina;
E um dia encontramo-nos para percorrer a linha
E assentarmos o muro outra vez entre nós.
Mantemos o muro entre nós enquanto avançamos.
A cada um as pedras que caíram para cada um.
E algumas são formas e outras são tão como bolas
Que temos de usar um feitiço para as equilibrar:
“Fica onde estás até voltarmos as costas!”
Ficamos com os dedos ásperos de as manipular.
Oh, somente outro gênero de jogo ao ar livre,
Um de cada lado. Mas vai mais longe:
Aí onde se encontra, nós não precisamos de muro:
Ele é todo pinheiros e eu sou um pomar de maçãs.
As minhas macieiras nunca atravessarão
Para comer os cones sob os seus pinheiros, digo-lhe eu.
Ele só me diz, “Boas cercas fazem bons vizinhos.”
A primavera instiga-me e pergunto-me
Se lhe posso despertar a razão:
“Porque razão fazem bons vizinhos? Isso não é
Onde existem vacas? Mas aqui não há vacas.
Antes de construir um muro eu inquiriria para saber
O que estaria a incluir ou a excluir,
E a quem era suposto ofender.
Alguma coisa existe que não aprecia o muro,
Que o quer no chão”. Poderia dizer-lhe “duendes”,
Mas não são duendes exactamente, e eu prefiro
Que ele o diga a si próprio. Vejo-o por ali,
A agarrar uma pedra com firmeza pelo topo
Em cada mão, como um antigo selvagem armado de pedras.
Move-se na escuridão e parece-me,
Não apenas a das florestas e a da sombra das árvores.
Ele não irá atrás do dito de seu pai,
Gosta de ter pensado naquilo tão bem
E diz novamente, “Boas cercas fazem bons vizinhos.”

 

Blade Runner

A melhor e mais completa análise do filme que já li.
O texto é um tanto longo mas foi escrito por Renata Cordeiro, bacharel em filosofia, tradutora de livros em vários idiomas, dentre outras atividades.

A impressão que tenho é que Blade Runner é um filme/estudo para se assistir em vários momentos de nossa vida. Vale muito à pena conferir a revisão de Blade Runner por esta excelente escritora e crítica.
Aí no vídeo a cena romântica mais complexa do cinema. Ela não parece replicante, enquanto ele… bem, até hoje não sei se Harrison Ford é humano ou não.